Fazendo a ponte entre a Cadeia de Suprimentos e Finanças

Desde 2020, cadeias de suprimentos passam por um período de intensa turbulência. Ainda assim, há aqueles que persistiram através de métodos de planejamento bastante sólidos. Isso porque a maioria das empresas de manufatura utiliza duas formas diferentes para se planejar: o departamento financeiro determina orçamentos e as necessidades de capital, e o departamento de operações equilibra a oferta e a demanda para determinar a capacidade e os materiais.

Quando o período de recessão persiste, como vem acontecendo, o departamento de operações deve tomar decisões importantes para mitigar riscos ou explorar oportunidades inéditas. Na verdade, a distância entre o plano financeiro e o plano operacional pode ficar maior, a ponto dos dois planos seguirem por caminhos muito diferentes.

A cadeia de suprimentos vem sofrendo pressão para maior alinhamento da estratégia corporativa. Para que isso aconteça, a primeira coisa a ser feita é alinhar o aspecto financeiro em particular com o planejamento financeiro como um todo. Encontrar e executar a estratégia mais lucrativa entre diversos cenários possíveis. Só que isso pode ser um problema.

A falta de conexão entre planejamento da cadeia de suprimentos e finanças não é uma novidade. Todo ano, os departamentos financeiros costumavam criar o orçamento e a cadeia de suprimentos testava esse orçamento no plano. Esse é um modelo repleto de armadilhas, uma vez que a contribuição da equipe de Supply Chain na criação do orçamento costuma ser mínima, pois geralmente está interessada em objetivos como pontualidade e integridade de entrega, rotatividade de estoque e uso de recursos. O respeito pelo orçamento ficava, muitas vezes, em segundo plano.

Outro motivo é o bloqueio do orçamento, que costuma ocorrer no início do ano. Nenhum plano, mesmo que muito bem elaborado, pode prever tudo. O orçamento não é uma exceção, e sofre mudanças naturais ao longo do percurso.

O ideal é que as empresas integrem mais tomadas de decisões de planejamento financeiro no planejamento da cadeia de suprimentos. Uma das soluções para isso é falar a mesma língua, proporcionando aproximação entre o planejador operacional e o analista financeiro. É o que explica Fernando Bertozzo, especialista da C&S em Transações Corporativas.

“Onde o operacional gerencia horas extras e frete acelerado, o financeiro vê declínio na lucratividade. Quando o planejador calcula o estoque de pré-temporada para atender a um pico de demanda, o analista financeiro vê um aumento no capital de giro e uma fuga de caixa. A lista de potenciais conflitos é extensa. Por isso, apesar da linguagem e métricas serem diferentes para cada departamento, os objetivos básicos devem ser os mesmos: impulsionar a lucratividade, o crescimento e o alinhamento com a estratégia de negócios”.

O papa da administração Peter Drucker, disse uma vez que o maior perigo em tempos de turbulência não é a turbulência em si, mas sim agir com a lógica do passado. De fato, para pensarmos de uma forma nova, seria então preciso alinhar as finanças e o planejamento da cadeia de suprimentos.

O primeiro passo é alinhar os modelos de planejamento. O modelo deve abranger todas as movimentações de estoque, custos e receitas, assim como as restrições do negócio. Depois, deve ser alinhado o horizonte, garantindo que as métricas sejam calculadas dentro da estrutura de calendário. Será preciso que um membro da equipe analise valores semanais, enquanto outro analisa o valor mensal, chegando a uma decisão conjunta.

Em seguida, vem o alinhamento de métricas. Os parâmetros financeiros devem ser disponibilizados e adequados ao modelo da cadeia de suprimentos, com classificação em categorias de rentabilidade, orçamento e capital de giro. Essas métricas têm como objetivo comparar pelo menos dois cenários e tomar uma decisão com base na análise financeira. A ideia é complementar o planejamento financeiro, e não substituí-lo.

Por fim, deve-se alinhar os critérios para atingir o sucesso. Fernando Bertozzo afirma que esse é o momento de encontrar um equilíbrio dentro dos limites de cada departamento.

“A equipe chegará a um entendimento do que é aceitável e do que não é para cada área. A intenção é formar um acordo mútuo, com compensações entre parâmetros e restrições financeiras e demanda, oferta e estoque. Assim, equilibra-se as metas funcionais de cada departamento com um plano de negócios integrado e alinhado à estratégia corporativa”.

Geralmente, os planejamentos financeiros se baseiam em processos de negócios e contabilidade. O planejamento da cadeia de suprimentos é baseado em processos de planejamento de demanda, de planejamento de suprimentos e S&OP – que é planejamento de vendas e operações. Cada parte interessada da cadeia de suprimentos e das finanças deve ter um papel a desempenhar nos processos uma da outra, para que exista eficácia.

Vamos trazer aqui alguns exemplos de processos que tiraram vantagem de uma equipe multifuncional.

Começando por um exemplo de orçamento. Se o orçamento vier de um plano financeiro de cima pra baixo ou de uma cadeia de suprimentos de baixo pra cima, em longo prazo, é essencial que o processo orçamentário seja sustentado pelo planejamento da cadeia de suprimentos. Uma simulação online e uma análise hipotética contribuem e muito para o processo.

Já um planejamento de infraestrutura de longo prazo, pode usar ferramentas do Supply Chain Planning para identificar a capacidade necessária e o tempo provável de retorno.

O S&OP, por sua vez, tem uma função especificamente projetada para tomadores de decisões financeiras. A participação da equipe financeira nas discussões de S&OP vai demonstrar como ela contribui para o alinhamento com as metas financeiras.

Outro caso é o de planejamento de demanda. Quando uma demanda orgânica não está plenamente alinhada com a capacidade ou orçamento, os gestores de demanda junto com o marketing agem para remodelar a demanda do produto. Quando a equipe financeira participa, observamos alavancas adicionais, que podem aumentar, atrasar ou acelerar a demanda. Pode-se tratar de valores como prazos de pagamento mais longos por realocação de capital de giro; prazos de entrega reduzidos por conta de uma análise de custo, etc.

Falando agora sobre gerenciamento de riscos, no planejamento da cadeia de suprimentos ele difere do planejamento financeiro. Para a cadeia de suprimentos, o risco é avaliado geralmente com base na validade de premissas como a realização de uma demanda especulativa, ou a continuação das operações de fabricação sem que haja paralisações não planejadas.

No planejamento financeiro, os riscos estão relacionados a questões como exposição a moedas estrangeiras ou demanda antecipada, para justificar o retorno do investimento. O S&OP é o processo natural de avaliação de riscos da cadeia de suprimentos, e como consequência, dos riscos financeiros decorrentes das decisões.

Planejamento da cadeia de suprimentos financeiros não é sobre prever a futura demonstração de resultados ou inventários. Trata-se da utilização de métricas financeiras para embasar a melhor decisão possível, comparando diversos cenários, avaliando simultaneamente a cadeia de suprimentos e as métricas financeiras.

Fernando Bertozzo também ressalta a importância do benchmarking industrial. “Ao analisarmos os parâmetros isoladamente, o contexto pode se confundir. Quando comparamos uma determinada métrica em vários cenários de planejamento, é possível obter um melhor contexto. Através do rastreamento da comparação de métricas específicas, com benchmarks do setor ou uma meta previamente estipulada, conseguimos observar melhor o progresso e avaliar as melhorias”.

Muitos dos conceitos descritos aqui fazem parte do S&OP ou do Planejamento Integrado de Negócios (IBP). Porém, a integração do planejamento financeiro ao planejamento da cadeia de suprimentos foge dos limites do S&OP ou IBP, pois esses processos visam um horizonte tático e gerenciam níveis agregados de valores de planejamento em períodos mensais. Na contramão, os parâmetros financeiros podem influenciar as decisões de planejamento, desde as operações do dia a dia até decisões estratégicas anuais. Ou seja, a influência do conhecimento financeiro não deve se limitar às decisões de planejamento dentro dos limites do S&OP ou do IBP.

É preciso colocar um fim na análise isolada do planejamento financeiro e do planejamento da cadeia de suprimentos, que agora devem estar relacionados. Empresas utilizam tecnologias digitais para atualizar seus planos operacionais quase em tempo real, se beneficiando de informações sobre novos riscos e novas oportunidades. É fundamental que as decisões sejam tomadas de acordo com a estratégia corporativa e, portanto, fatores de decisão financeira devem ser integrados aos processos de planejamento da cadeia de suprimentos, encontrando e executando a estratégia mais lucrativa entre muitos cenários possíveis.

Fonte: VoxLog

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